Uma interrogação sobre a América

Three Flags, Jasper Johns
É difícil resistir a um quadro na exposição que o Museu Whitney Museum de Arte Americana escolheu para inaugurar a nova morada, numa zona que faz fronteira com os bairros de Chelsea e West Village, a zona de excelência das galerias de Manhattan que têm conseguido resistido às rendas elevadas e à Internet, enquanto montra das obras e dos artistas. Esse quadro é Early Sunday Morning, que Eduard Hopper pintou no mesmo ano em que Gertrude Vanderbilt Whitney fundou o museu. O pintor descreveu-o como uma “tradução quase literal da sétima avenida” nos anos trinta e marca aqui uma intenção, a de que o museu é inseparável do seu território e das questões que ele coloca. No caso a cidade de Nova Iorque e dessa cidade enquanto metáfora da América.
Obra de Jackson Pollock
America is Hard to See é o nome da exposição inaugural e pretende relançar o olhar sobre a história da arte nos Estados Unidos desde o início do século XX até à actualidade. São mais de 600 obras de 400 artistas organizadas de forma cronológica no que pretende ser também uma reflexão política. Inspirado num poema Robert Frost de 1951, que imagina Cristóvão Colombo a desmaiar quando se depara com a América, e num documentário de Emile de Antonio de 1970, o título daquela que é a maior exposição de sempre da história do Whitney pretende retratar o conflito que está por detrás da criação artística, a luta contra convenções instituídas, o inconformismo, o questionar incómodo. 
September 11, 2001, de Keith Mayerson
Os seus curadores — com Donna de Salvo como principal ideóloga —  têm insistido nessa ideia e escolheram obras que pretendem ser simbólicas de um dos principais movimentos e momentos da arte americana.
Dividida em 23 secções, representativas de épocas e estilos, a exposição começa no piso térreo, onde alguns visitantes podem ter um vislumbre de algumas obras, antes de pagaram os 22 dólares (cerca de 20 euros) de entrada que lhes permitem ver algumas peças pouco ou nunca exibidas, entre outras muito familiares, como as telas de Hopper, as esculturas de David Smith num dos terraços sobre o High Line, as fotografias de Diane Arbus ouas  pinturas de Jasper Johns.

Red Smile, de Alex Katz
Um dos efeitos mais salientes da mostra é a relação que existe sempre entre a arte e a cidade. O museu é aberto e a relação entre espaço interior e exterior permite um olhar renovado sobre obras há muito vistas. As sombras projectadas em Running People, de Jonathan Borofsky, uma gigantesca tela colocada no quinto piso do museu de frente para o rio Hudson, conferem uma nova abordagem da obra, dando a ilusão de que o movimento dos visitantes entra no quadro. O efeito é marcante e atravessa toda a mostra, montada de forma a criar efeitos surpresa numa relação harmoniosa com o espaço, mas capaz de desconcertar. É o caso do efeito de quase intimidade conseguido com as obras colocadas no último piso, o início cronológico da exposição, duas pinturas de Marsden Hartley do início do século XX.

Saigon, 1967, de Peter Saul

Outro ponto a destacar é o modo como, além da cronologia, as obras obedecem a uma organização social e política patente na escolha de títulos para cada uma das divisões por época ou movimento. A Grande Depressão, a Segunda Guerra Mundial, o retrato do Ku Klux Klan feito por Philip Guston. A pintura minimal de Joe Baer ou Frank Stella, ou a de Keith Mayerson do World Trade Center em fumo, antes de cair. O sentimento de proximidade atravessa a exposição. A América esta ali e logo ali, lá fora, nessa tal relação que ilude e une quem vê e quem cria.

Phil(1969), de Chuck Close