Nikias Skapinakis. Presente e Passado, 2012 — 1950


Nikias Skapinakis. Retrato dos criticos
Esta exposição, que se apresenta agora no Museu Coleção Berardo, constitui a mais ampla e significativa antologia dedicada à obra de Nikias Skapinakis, reconhecido como um dos nomes mais relevantes da arte portuguesa na segunda metade do século XX. A exposição, comissariada por Raquel Henriques da Silva, organiza-se em sete núcleos reveladores da extraordinária amplitude e diversidade, bem como das inúmeras possibilidades formais e expressivas do trabalho de Nikias Skapinakis, desenvolvido durante mais de sessenta anos. A singular capacidade de síntese na abordagem da imagem e o permanente diálogo com a cultura ocidental, que as suas pinturas definem, torna claro o sentido e o valor do seu contributo. Esta exposição, que se apresenta agora no Museu Coleção Berardo, constitui a mais ampla e significativa antologia dedicada à obra de Nikias Skapinakis, reconhecido como um dos nomes mais relevantes da arte portuguesa na segunda metade do século XX. A exposição, comissariada por Raquel Henriques da Silva, organiza-se em sete núcleos reveladores da extraordinária amplitude e diversidade, bem como das inúmeras possibilidades formais e expressivas do trabalho de Nikias Skapinakis, desenvolvido durante mais de sessenta anos. A
singular capacidade de síntese na abordagem da imagem e o permanente diálogo com a cultura portuguesa ou ocidental, que as suas pinturas definem, torna claro o sentido e o valor do seu contributo para um entendimento das mesmas.
  
Nikias Skapinakis.
“Todos os homens por natureza desejam saber. Sinal disso é o amor aos sentidos. Estes, com efeito, são amados por si mesmos, à margem da sua utilidade e mais que todos o da vista. Com efeito, não só para agir mas também quando não vamos actuar, preferimos a vista – digamo-lo – a todos os demais. A causa é que este é, dos sentidos, aquele que mais nos faz conhecer e mostra múltiplas diferenças”.



Aristóteles, Metafísica, Livro I, Capítulo I

A responsabilidade do plano desta exposição cabe-me inteiramente. Não pretendi, aliás, apresentar uma retrospectiva – já que entendo que é o tempo que se encarrega do historial dos acontecimentos. Pretendi, antes, delinear uma escolha de obras, em função de conjuntos que pudessem resumir e tornar compreensível o meu trabalho de pintor. Pela primeira vez, sem interrupções, uma exposição abrange a minha intervenção, que parte, propositadamente, do presente para o passado. Fui, de resto, objeto de outras antologias significativas: no Centro de Arte Moderna da FundaçãoCalouste Gulbenkian em 1985 (Pintura, 1950-1985), no Museu do Chiado em 1996 (Para o estudo da melancolia.
Os parâmetros museológicos e as minhas próprias intenções limitaram, porém, o âmbito temporal dessas apresentações. A exposição no Museu Colecção Berardo constitui, portanto, o mais vasto depoimento que realizei sobre o meu trabalho. Com o passar dos anos, foram-me atribuídas algumas classificações genéricas – expressionista, neorrealista, pop, pós-modernista, clássico, metafísico... Com excepção da asserção neorrealista, que era despropositada, todas as outras designações respeitam, efectivamente, a aspectos mais ou menos prolongados do meu trabalho.



Todavia, e embora reconheça a sua eficácia didática, penso que nenhuma delas abarca o sentido geral da minha pintura, na medida em que ficam de fora dessas classificações aspectos que julgo significativos e que sobram do que é arrumado do ponto de vista crítico. Os meus começos não tiveram nada em comum com o movimento neorrealista; bem pelo contrário, como esta exposição demonstra. Nos anos de 1950, a minha ligação foi essencialmente à primeira Escola de Paris, e nela avulta a figura tutelar de Chagall. Seguiram-se-lhe, naturalmente, muitas outras, contemporâneas e muitas vezes pertencendo ao passado, como no caso da perene recordação do Greco de Toledo. Essas múltiplas influências educaram o meu olhar e guiaram a minha mão, permitindo-me a afirmação de uma expressão pictórica que entendo própria. A pintura italiana do Quattrocento teve muita importância para o meu trabalho, todavia os grandes pintores italianos do século XX, como De Chirico e Morandi, que sempre admirei, nunca constituíram uma fonte de inspiração (é para Zurbaran que olho e também para Chardin). O sentido metafísico, que, juntamente com o pendor expressionista e lírico, atravessa prolongadamente o meu trabalho, tem, do meu ponto de vista, uma tripla origem: - Os frescos “clássicos” e “modernos” da Vila dos Mistérios, em Pompeia, e Carpaccio, a quem dedico em 1961 uma homenagem, porque, justamente, venho a encontrar nele o sentido de ausência das figuras que habitavam o meu paisagismo de então; - A poesia, designadamente de Cesário e dos “presencistas”; - A pressão claustrofóbica e entediante do ambiente português das décadas de 1950 e 60. O meu silêncio permaneceu sempre ligado ao real quotidiano. Mas, naturalmente, o tempo aperta e simplifica o entendimento das coisas.
De qualquer modo, porém, acredito que a minha “linha metafísica” se liga essencialmente a uma concessão individualizada da pintura como um processo de conhecimento, literalmente, para além das aparências físicas, que os sentidos transmitem. Esse processo define a história da pintura desde o seu remoto passado até ao presente. Porque é específico, não pode ser repartido por outros campos estéticos sem que essa qualidade essencial de indagação tenda a alterar-se ou a perder-se em favor de outras (embora igualmente válidas) expressões. Trata-se de procurar a essência das coisas; mas, talvez, as coisas não tenham realmente essência nenhuma e a sua busca seja inútil. É uma dúvida de natureza metafísica que procuro resolver continuando a pintar.



Nikias Skapinakis, 2012